De: adonarepres@bol.com.br [mailto:adonarepres@bol.com.br]
Enviada em: segunda-feira, 22 de outubro de 2012 20:22
Para: eliana@terceirotempo.com.br
Assunto: Airton Ferreira da Silva/Milton Neves
Informações pessoais |
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Nome completo |
Airton Ferreira da Silva |
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Data de nasc. |
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Local de nasc. |
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Falecido em |
3 de abril de 2012 (77 anos) |
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Apelido |
Pavilhão |
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Informações profissionais |
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Posição |
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Clubes profissionais |
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Anos |
Clubes |
Jogos (golos) |
Edições: 1956, 1957, 1958, 1959, 1960, 1962, 1963, 1964, 1965, 1966 e 1967.
Coube a mim a tarefa, involuntária, de dar a notícia da morte de Airton Ferreira da Silva ao seu grande companheiro de Grêmio e amigo eterno, Alcido Marta de Freitas, o Bugre chucro.
Telefonei assim que soube da morte de um dos maiores nomes do futebol gaúcho e brasileiro, em busca de um depoimento sobre a perda irreparável de um gigante.
E Alcindo me contou, emocionado, uma história linda e absolutamente emblemática para que qualquer pessoa, de 0 a 100 anos, saiba com exatidão quem foi Aírton Pavilhão. Com a palavra, Alcindo, o centroavante que saiu do Grêmio e foi para o Santos a pedido de Pelé, em 1971:
- Quando cheguei no Santos, claro, eu falava muito com o Pelé. Ele tinha sido importante para a minha contratação. Numa dessas conversas, o Pelé quis saber sobre o Aírton. Me falou sobre aquele queixudo grande e elegante, que marcava sem fazer falta.
O Pelé me disse que tinha jogado contra ele sem que fosse tocado uma vez sequer. Sem uma falta, nada. E, mesmo assim, o Pelé me garantiu que era quase impossível driblá-lo.
Impossível não podia ser, porque Pelé é Pelé. Mas o Pelé se encantou com o Aírton. Dizia, impressionado: "Aquela cara me marcou sem fazer falta! Sem nem me tocar. E me marcou, realmente me marcou".
Para mim, o Aírton era o melhor zagueiro do mundo. Eu sou centroavante, joguei com ele, treinei com ele centenas de vezes e digo: era o melhor zagueiro do mundo. Meu testemunho é esse. Eu ouvi o que te conto agora da boca de Pelé, simplesmente do Pelé.
Poderia existir um depoimento mais espetacular do que este sobre Airton Ferreira da Silva?
Aírton Ferreira da Silva, o Pavilhão (31/10/1934 ? 3/4/2012)
Aírton Ferreira da Silva, o Pavilhão, gaúcho de Porto Alegre (31 de outubro de 1934), zagueiro-central que marcou época no Grêmio, um dos maiores jogadores do futebol gaúcho, morreu na tarde desta terça-feira, no Hospital Ernesto Dorneles, vítima de complicações causadas pela Hepatite C.
Zagueiro forte e de técnica excepcional, ele marcou época por jogar sem fazer falta. Conta a lenda que na única vez em que atendeu pedidos de dirigentes para fazer falta em Larry, atacante do Inter na época, acabou se machucando. Não sabia atuar assim. Para ele, a marcação tinha, obrigatoriamente, de ser limpa.
Foi assim que ele despertou a atenção do Grêmio em 1954. Aírton jogava no Força e Luz, time de Porto Alegre com sede próxima do Hospital de Clínicas de hoje. Em troca do jogador, o Grêmio cedeu ao Força e Luz um pavilhão de madeira do tempo da Baixada ? e isso acabou sendo incorporado ao nome de Aírton, que passou a ser o Pavilhão (hoje, restos desta arquibancada estão no centro de treinamento do Cristal).
Foi sete vezes convocado para a Seleção, esteve no Santos em 1960, voltou a Porto Alegre e seguiu aqui até o fim da carreira. Era tão ligado a seus amigos e ao Grêmio que morou a vida toda em uma casa perto do Olímpico.
Para muitos, Aírton só não se firmou na Seleção e no Santos porque tinha estilo demais. Uma de suas jogadas levava os técnicos à loucura ? ao menos, os que não o conheciam bem: ele recebia a bola na lateral da área e devolvia para o goleiro de letra, muitas vezes por cima do atacante. Fez isso até em um dos treinos no Santos de Pelé.
Aírton fazia parte daquele grupo de jogadores, dos dois lados, que romperam as barreiras da rivalidade. Era aceito no Inter, tinha amigos por lá, costumava circular sem temor pelos ambientes dos rivais, assim como Cláudio Duarte, Larry e Valdomiro, entre outros, podiam caminhar sem qualquer perturbação no meio dos gremistas. Aírton, a exemplo de outros, era de uma família de profissionais que rompia com a rivalidade.
É uma parte considerável da história do futebol gaúcho que chega ao fim.
Airton Pavilhão, que não fazia faltas, fará falta para sempre! Por Airton Gontow
Alto, forte e extremamente clássico, o jovem Airton despertou o interesse dos dirigentes gremistas. Jogava pelo pequeno Força e Luz, time porto-alegrense, que tinha gramado, mas não possuía um estádio. O Grêmio fez uma boa proposta. Acima das suas possibilidades. Mas o Força e Luz quis mais, bem mais. Foi aí que aconteceu a mais surpreendente das ofertas: 50 mil cruzeiros e mais o Pavilhão Social do estádio da Baixada.
Era o ano de 1954 e Airton foi para o Grêmio. Ou melhor, agora o tricolor gaúcho tinha o "Airton Pavilhão", o homem que foi trocado por um estádio de futebol.
O ato aparentemente insano da diretoria - de trocar um patrimônio por uma simples promessa, de 19 anos, que poderia nem mesmo vingar ou até sofrer alguma contusão em um período em que a medicina esportiva era tão insipiente - se mostrou o maior negócio da história gremista.
Airton valia mais que um estádio!
Em 12 temporadas, ganhou cerca de 17 títulos, entre eles de pentacampeão gaúcho de 56 a 60 e o hexacampeonato estadual de 62 a 67. Tinha a companhia de craques, mas era o grande nome da equipe. Durante os anos em que atuou no tricolor dos pampas, aconteceram 52 grenais. Com ele, foram 42 jo..gos, com 22 vitórias, oito empates e 12 derrotas. Sem ele, nenhuma vitória tricolor. Foram dez jogos, sete ganhos pelo Inter e três empatados.
Ficou famoso também por uma jogada que só ele era capaz de fazer: em muitos jogos, levava a bola em direção à bandeirinha de escanteio, levando com ele alguns jogadores adversários. Aí virava o corpo e, colocando uma perna por trás da outra, recuava, de letra, a bola para as mãos do goleiro e, claro, para o delírio dos torcedores.
Nunca errou, mas alguns consideram que esta aparente irresponsabilidade foi responsável por sua não permanência na Seleção Brasileira, apesar de ter até conquistado o título de campeão Pan-Americano, em 56.
Segundo o conceituado comentarista gaúcho Ruy Carlos Ostermann, que viu atuarem pelas equipes gaúchas zagueiros como Calvet, Figueroa, De Leon, Anchieta e Gamarra e que acompanhou inúmeras Copas do Mundo, Airton Pavilhão foi o melhor defensor que assistiu em campo: "Não conheci zagueiro melhor do que ele...marcava sem pontapé, sem esforço físico, marcava naturalmente", diz Ostermann. Para o jornalista e escritor Paulo Sant"Ana, conhecido por seus belos textos e também pelo seu fanatismo pelo tricolor gaúcho, Airton Pavilhão foi o maior craque da história gremista, acima de jogadores como Ronaldinho Gaúcho, Eurico Lara e Renato Portaluppi.
Ídolo da torcida, foi admirado até pelos grandes rivais. No ano passado, estive no Beira-Rio e entrevistei Claudiomiro, ex-centroavante do Internacional. "Qual é o melhor zagueiro que enfrentaste?", indaguei. Ele foi taxativo: "Airton, Pavilhão!" e explicou: "Além de ser quase impossível passar por ele, nunca dava um pontapé, era incapaz de fazer uma falta".
Ao jornalista gaúcho Diogo Olivier, o histórico centroavante gremista Alcindo, que atuou pelo Santos nos 70, contou que Pelé tinha a mesma admiração. "Era quase impossível driblá-lo. Aquele cara me marcou sem fazer falta! Sem me tocar. E me marcou. Realmente me marcou! E ainda por cima não fazia uma única falta. Marcou-me sem me tocar", disse o Rei do Futebol.
"Se eu desse um pontapé, morreria de vergonha. Deus me livre de querer machucar alguém que tem família. A prejudicada seria a família. Acho que por ano eu fazia umas cinco faltas. Faltas com o corpo. Eu nunca machuquei ninguém", contou-me o jogador.
Apenas duas vezes encontrei Airton Pavilhão pessoalmente. A primeira foi há quase 20 anos, durante uma destas crises que praticamente todos temos em alguma etapa da vida e emergem questões como "quem sou?", "era mesmo essa profissão que eu queria seguir?", "sou feliz?"... Fui a Porto Alegre, minha cidade natal, se não em busca de respostas, ao menos para recarregar as energias.
Visitei o apartamento da infância, a antiga escola, o Olímpico...e quando me aproximava do estádio, vi uma casa azul, simples e digna. De repente, como em um sonho, saiu do portão um homem alto, forte, queixudo e de cabeça erguida. Era o Airton Pavilhão! .
Sem pensar, fui até ele e exclamei: "eu me chamo Airton por tua causa!". E contei que meus pais queriam que meu nome começasse com letra "a" e que estava resolvido que seria Arthur ou Ana. "Mas jogaste tantos jogos fantásticos naqueles meses que meu pai decidiu que seria Airton, em tua homenagem!"
De repente, estávamos abraçados. Abraçados e chorando. Choramos pelo Grêmio. Pelo futebol. Pela história. Pelas perdas, pelos ganhos. Pela vida! No dia seguinte eu estava pronto para voltar a São Paulo e recomeçar a batalha do dia-a-dia.
Nosso segundo e último encontro foi no ano passado. Aconteceu depois que li nos jornais que ele havia retornado para casa, após dias no hospital.
Recebeu-me deitado, no quarto da filha. Estava abatido, falava com a voz bem baixa. Perguntei se sentia dor. Respondeu que não doía o corpo, mas a alma. Pouco depois desabafou: "Sinto muita falta de jogar. Eu queria muito jogar um Gre-Nal, entrar em campo...".
Olhei estupefato para aquele senhor de 76 anos. Ele não havia parado há poucos meses. Nem mesmo há poucos anos. Tinha parado nos anos 60! E sentia muita falta de estar em campo!
Continuei a conversa: "Tu às vezes sonha que estás jogando?"
Ele olhou-me nos olhos e respondeu: "Sonho sempre, mas é muito difícil."
Eu quis saber o motivo; e Airton Pavilhão prosseguiu:
"É que sempre que sonho, o estádio está cheio e quando vou entrar em campo não acho a botina, a chuteira, a camiseta, o gramado. É uma coisa que tortura a gente. Uma coisa que a gente não entende", disse.
Ontem, terça-feira, dia 3 de abril, recebi notícia de que Airton Ferreira da Silva, o Airton Pavilhão, conselheiro do Grêmio e grande nome da história do time gaúcho, morreu por infecção generalizada nos órgãos, no hospital Ernesto Dornelles.
2012 ficará marcado para sempre no coração dos tricolores gaúchos como o ano em que o Grêmio ganhou sua imponente Arena, mas perdeu o seu Pavilhão.
Aquele zagueiro forte e clássico que nunca fazia faltas fará, ironicamente, falta para sempre.
Não posso saber se em alguma das noites de último ano de vida, Airton Pavilhão conseguiu sonhar que estava em campo, mas posso assegurar que, como maior craque da história do nosso clube, ele está no time dos sonhos de todos os gremistas.
- Descanse em paz e entre em campo, Pavilhão!
Airton Gontow, 53 anos, é jornalista e cronista.
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