Se você me leu até aqui é porque decerto também gosta de argentinismos semelhantes. Nem que seja o Rayito de Sol, o chiclete Bazooka, os casacos de couro molinho ou o Malbec. Por que então nos dá tanta gastura um argentino? Só pode ser pelo futebol.

Se você me leu até aqui é porque decerto também gosta de argentinismos semelhantes. Nem que seja o Rayito de Sol, o chiclete Bazooka, os casacos de couro molinho ou o Malbec. Por que então nos dá tanta gastura um argentino? Só pode ser pelo futebol.

Colecionei vários amigos argentinos, que comigo trabalham hoje ou trabalharam um dia. Talvez não haja provação maior que ter sido no passado cunhado de um argentino, a quem maldosamente apelidei de “Barsa”, pois sabia de tudo e tinha grande dificuldade de concordar comigo no que quer que fosse, até mesmo se o café estava ou não adoçado demais.

Um chato enciclopédico. Apesar do Barsa, adoro a Argentina. Sou fã de Piazzolla, Mercedes Sosa, Les Luthiers e Bajofondo. Também acho Buenos Aires um charme. Gosto do doce de leite deles, do ojo de bife, do asado de tira, de chimichurri. Tenho Francis Mallmann como um gênio do fogo.

De Borges, Cortázar e Bioy Casares nem é preciso falar. O mesmo vale para Ricardo Darín, de tantos filmes excepcionais. A gíria típica portenha, o lunfardo que povoa as letras dos tangos mais antigos, é deliciosa aos ouvidos, cheia de sílabas trocadas em vesre.

Papa Francisco nasceu lá e vem se revelando um admirável humanista, até para quem não é religioso como eu. Poderia enumerar mais um tanto de admirações minhas pelos "vizinhos irmãos" (estou proibido por uns amigos de usar a palavra irmãos em castelhano...), mas deixo aqui somente uma a mais. Numa das vezes que fui a Bs.As., acabei comprando um bandoneón, iludido que poderia aprender a tocar aquele indecifrável instrumento.

Se você me leu até aqui é porque decerto também gosta de argentinismos semelhantes. Nem que seja o Rayito de Sol, o chiclete Bazooka, os casacos de couro molinho ou o Malbec. Por que então nos dá tanta gastura um argentino? Só pode ser pelo futebol.

Uma vez, ao entrar no La Bombonera vazio, estádio do Boca Jrs., imaginei o quanto deve ser penoso enfrentá-los lá dentro. Impossível não sentir na espinha o frio que brota da ameaçadora arquibancada a pouquíssimos metros do gramado, cheia de “barras” furiosos a cantar e a xingar, ameaçando-nos infindavelmente.

E nos ameaçam também esportivamente, pois sabem de bola. Mais que muitos por aí. Seu orgulho, muitas vezes tachado por mim mesmo como arrogância, os leva até a defender, sem brincadeira, que Maradona fue “más grande que Pelé”. Nem entre os mais delirantes seres que habitam a galáxia se encontra algum 

não-argentino que concorde com essa idiotez. Eles tem um amor ao futebol que em tudo se assemelha ao nosso. É justo que estejam nessa final da Copa do Mundo. Mereceram, por seu espírito combativo, ótimo toque de bola, defesa segura e pelos fora-de-série Di Maria e Messi. Nós, não. Veremos toda essa festa de longe, chupando o dedo e nos contorcendo de despeito.

Chegaram aos trancos e agora estarão diante da chance de fazerem história e ficarem com a taça. Mas terão pela frente os impassíveis alemães – que, divago, foram no passado os inventores do bandoneón ( o que isso tem a ver?) - e que tem jogado com técnica e talento, merecedores também de chegar à final. Entre alemães tenho outro tanto de amigos, além de ser o país onde morou e foi feliz um de meus filhos. Quis deles aprender sem conseguir o idioma, dificílimo. O que prova minha admiração por esse povo também humilhado pela guerra há tão pouco, mas que soube se reinventar e reinventar seus sonhos.

Da Alemanha gosto de muitas coisas, como da verdadeira água de Colônia, dos pães, cerveja, steinhaeger e dos carros. Também me desgostam várias outras germanices, etc. etc., mas não sua torcida, ordeira e alegre. Já me alonguei muito para quem só queria dizer que ficará neutro. É isso. Virei um Tribunal de Haia. E de quebra arranjei umas boas desculpas para alguns de vocês que, como eu, não vivem de secar a pimenteira dos outros. Torcerei somente por uma bela final e aplaudirei quem vencer. Que seja na bola, que seja o melhor e que não seja nos pênaltis. Ufa!

 

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Por Juca Silveira é diretor da TV Bandeirantes desde 1986.

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