Por Adonis Alonso
Naquele 6 de agosto de 1951, Muzambinho não fez festa. Hoje, cinqüenta anos depois, já tem motivos para comemorar a data de nascimento de um de seus filhos mais ilustres.
O Brasil começava a esquecer do fracasso da Copa de 50, e no lugar da tristeza da tragédia do Maracanã surgia a admiração por uma nova geração de craques. No final da década eles enfim dariam o sonhado título mundial de futebol ao País.
Milton Neves Filho conviveu pouco com o pai, de quem herdou o nome. O suficiente, porém, para lembrar das tardes em que ele ficava na varanda de seu sítio "Invernada", em Monte Belo, que lá chamavam de alpendre, colado no radinho de pilha Mitsubishi. Além do rádio que mantém até hoje de recordação, Milton Neves guarda na memória os elogios que o pai fazia ao volante Écio, do Vasco da Gama.
Natural de Areado e criado em Varginha, "seo" Milton viveu também em Monte Belo e casou em Muzambinho, com dona Carmen. Autêntico mineiro, sofreu entretanto a influência das transmissões esportivas cariocas, que chegavam com força em Varginha.
Assim, Milton Neves cresceu ouvindo do pai as histórias fantásticas do paulista Écio, nascido em Vinhedo, e seus companheiros do supertime do Vasco da Gama, como Paulinho, Bellini, Pinga e Coronel.
Com a morte do pai, em 1960, Milton, dona Carmen e seu irmão mais velho, Homero, foram viver na casa da professora Antonia Carlos Fernandes, irmã de dona Carmen.
Ela assumiu os sobrinhos como filhos e passou a comandar as despesas da família.
Com 10 anos de idade, em 61, o garoto Milton Neves tentava sem sucesso jogar futebol. E apesar de achar que é a pessoa pior dotada para praticar esse esporte, iniciou de criança uma paixão incontrolável pela bola.
Sem dinheiro para freqüentar o minúsculo estádio Professor Antônio Milhão, de Muzambinho, assistia aos jogos sentado no muro da casa da costureira Marta Borges, amiga da família.
Com olhar de pidão, invariavelmente convencia o porteiro "seo" Bruno a deixá-lo entrar para assistir o segundo tempo ao vivo.
Misturado aos 1.500 torcedores, lotação máxima do estádio, o garoto Milton fez de Muzambinho seu primeiro mundo futebolístico. Até hoje guarda na lembrança os nomes dos craques da cidade que se digladiavam nos jogos entre o Bandeirante, a Escola Agrícola e o Comércio. Eram Pedrinho, Candóca, Camila, Fominha, Cavadeira, Corote, Ivan Surdão, Cuiabano, Tente e Tôti entre outros.
Em Guaxupé, filho de abastada família, dona da Viação Nasser, Pachá era tão rico quanto bom de bola e bonachão. Para João Avelino, mineiro de Diamantina e técnico famoso nos anos 60 e 70, Pachá foi o melhor centroavante que ele já viu jogar. "Até melhor que Vavá, Coutinho, Pagão, Toninho Guerreiro e Romário", afirma o 71.
Pachá deixou passar muitas chances de jogar em grandes times. Deixou passar também o bonde da vida. Amparado em boas lembranças procurou Milton Neves nos estúdios da Jovem Pan. Morando em São Paulo, trabalha com camisas. A família perdeu a empresa de ônibus e ele teve que recuperar no comércio o sustento que poderia ter garantido com o futebol.
"Cresci ouvindo de meu pai os elogios para o maravilhoso time do Vasco, que tinha Barbosa, Belline, Pinga e Vavá. Pra ele, Écio era o máximo."Disputando o campeonato sul-mineiro com a Caldense de Poços de Caldas, Esportiva de Guaxupé e Cruz Preta de Alfenas, o Bandeirante de Muzambinho tinha ainda outros craques, como Fernando Montanari.
Milton Neves recorda bem desse nome porque sempre achou que craque deveria ter nome pomposo. Por isso, prefere Fernando Montanari a "Fominha", o apelido do jogador.
Levado ao Fluminense do Rio, pelo doutor Vicente Rondinelli, Montanari roubou o lugar de Clóvis no time e só não ficou no futebol carioca para poder atender aos apelos da namorada Maria Pires, que o preferia de volta a Muzambinho trabalhando no Banco Moreira Salles, hoje Unibanco.
Corote foi outro craque de Muzambinho que dispensou os convites da Portuguesa, do América e Olaria, do Rio de Janeiro. Não adiantaram os elogios de José Douglas Dallora, dentista e ex-presidente do SãoPaulo F.C., mineiro de Guaxupé e formado em Alfenas, que considerava Corote o melhor meio-de-campo do Brasil. Dona Virginia, mãe de Corote, preferiu trocar a fama que o filho poderia ter pela sua presença na casa da família em Muzambinho.
"O primeiro tempo eu assistia de cima do muro da casa da costureira. No segundo pedia pro "seo" Bruno porteiro e entrava no estádio." PLANTÃO NA COPA Pioneira na criação do plantão esportivo, e do Terceiro Tempo tão copiado, a Pan também foi a primeira a implantar o Plantão na Copa. Até então, nenhuma emissora de rádio havia deslocado um profissional de estúdio para cobrir a competição.
Milton Neves e suas histórias inovaram na Itália, em 90, comandando os programas esportivos da Jovem Pan direto de Roma, a sede do mundial. Em 94 a emissora repetiu o esquema de Dallas, no Texas. Na Itália, colocando no ar o incrível gol de Rincón (Alemanha 1 x 1 Colômbia) narrado pelo locutor Edgar Perea da Rádio Caracol de Bogotá, Milton Neves conseguiu pela Jovem Pan
"o mais importante e emocionante momento do rádio da Copa da Itália" segundo a Folha de São Paulo em texto assinado por Marcos Cézari.