Mesmo em grandes momentos, o país fez pouco para o desenvolvimento da modalidade

Mesmo em grandes momentos, o país fez pouco para o desenvolvimento da modalidade

O Brasil é o país do futebol? Bom, se falarmos de futebol feminino, a resposta é não. A eliminação das meninas da seleção brasileira na Copa do Mundo, diante da França, machucou o torcedor que apoiou e vibrou com nossas jogadoras, mas não surpreendeu ninguém. Acostumado a ver seu time chegar ao mundial de seleções como uma potência no masculino, o brasileiro viu um time mal treinado, defensivamente muito frágil, com pouquíssimas alternativas ofensivas, mas que foi mais competitivo do que muitos esperavam no mundial feminino.

No duelo entre brasileiras e francesas, passou a seleção mais estruturada, com trabalho pensado em longo prazo, que possui uma liga de alto nível e que potencializa seus talentos individuais com um coletivo forte. O Brasil foi até melhor do que se esperava, foi mais competitivo do que se especulava e perdeu porque no final das contas, no conjunto da obra (não apenas no 90 minutos) é pior.

Mesmo com muitos talentos individuais e com jogadoras atuando em grandes centros do futebol feminino, o Brasil não conseguiu se consolidar com uma verdadeira potência do esporte. Quando brilhou, foi azarão, e ainda assim não alcançou títulos de maior relevância. Na maior parte do tempo sobrou vontade e determinação, mas faltou organização e investimento para transformar, não só a seleção, mas a modalidade no país.

O desenvolvimento do futebol feminino deveria se dar a partir de políticas publicas e de um árduo trabalho da CBF (em conjunto com federações locais e clubes). No Brasil, porém, o esporte só se desenvolve a partir do surgimento de fenômenos. No caso do futebol entre as mulheres, nem o nascimento da maior jogadora da história foi capaz de colaborar para a consolidação da modalidade.

Apesar de todas as objeções, a seleção viveu momentos brilhantes que poderiam ter mudado a história da modalidade em terras tupiniquins. Foram ao menos quatro situações de campo que o país teve para, de fato, mudar o futebol feminino.

A dolorida e inesperada prata em 2004

Embora tenha alcançado um feito histórico, por muito pouco a seleção brasileira não fez algo inenarrável na disputa das Olimpíadas de Atenas. Longe de estar entre os favoritos, o Brasil chegou até a final do torneio feminino, encarou de igual para igual os Estados Unidos (que contavam com uma das maiores gerações do país na modalidade), empatou por 1 a 1 no tempo normal (o EUA saíram na frente com Tarpley ainda no primeiro tempo e o Brasil igualou com Pretinha já na parte final da segunda etapa) e sofreu a derrota doloridíssima na prorrogação (gol de Wambach há 3 minutos do final do jogo).

Ali a seleção vivia o “nascimento” do fenômeno Marta que encabeçava uma geração incrível, o time era carismático, o treinador Renê Simões montou uma equipe competitiva e que conseguiu fazer o país parar para acompanha-lo. Além disso, o Brasil ainda vivia um grande momento no futebol como um todo. Eram passados apenas dois anos do pentacampeonato conquistado pelo time masculino na Copa do Mundo de 2002, grandes nomes do futebol mundial eram brasileiros, ou seja, o cenário era absolutamente favorável para o fortalecimento do feminino, mas pouco foi feito.

O vice no mundial de 2007

Três anos após a histórica medalha de prata em Atenas, veio a Copa do Mundo de 2007, disputada na China. Mais madura, a geração de Marta e Cristiane chegou com outro status e fez mais uma campanha histórica.

Comandadas pelo técnico Jorge Barcelos, as meninas do Brasil foram até a grande final com 100% de aproveitamento: cinco vitórias em cinco jogos, com direito a uma goleada de 4 a 0 sobre os Estados Unidos na semifinal, numa apresentação estupenda de Marta. Na grande final, diante da Alemanha, veio mais uma derrota dolorida demais: pênalti perdido por Marta, pressão brasileira, bola na trave, mas no final das contas 2 a 0 para as alemãs no placar. O revés, porém, não apagou um fato: a seleção brasileira vivia um grande momento (meses antes, o time havia conquistado o ouro nos jogos Pan-Americanos disputados no Rio de Janeiro, num momento histórico, com o Maracanã lotado). Se nada foi feito para o desenvolvimento da modalidade pós-2004, aquela era o momento. Mas a história seguiu a mesma.

O filme repetido: a prata em 2008

As olímpiadas de 2008, em Pequim, foi outro grande momento das meninas do Brasil. A seleção tinha experiência, mantinha a qualidade e vinha num trabalho de longo tempo. Só não tinha investimento, ou um campeonato forte dentro do país.

O grande momento da seleção, mais uma vez, foi na semifinal da competição quando veio a vingança diante das alemãs: um sonoro 4 a 1 sobre as rivais na semifinal da competição. Na decisão, o adversário era conhecido: os Estados Unidos. O que muitos temiam aconteceu, derrota para as norte-americanas que fizeram 1 a 0 na prorrogação, gol de Carli Lloyd, e ficaram com o ouro novamente. A dor e a frustração pelo revés eram sinais claros diante dos dirigentes do futebol brasileiro. Já havia passado da hora de fortalecer a modalidade no país, mas pouca coisa mudou de lá pra cá.

As olimpíadas de 2016

Oito anos depois do último grande momento da seleção feminina, chegaram as Olimpíadas de 2016, disputadas no Rio de Janeiro. Ali, diferente daquelas campanhas históricas, o Brasil já não tinha mais uma grande seleção. O time era competitivo, havia talento individual, claro, mas o trabalho na seleção não era bom e, no cenário geral, o futebol feminino no país seguia sem apoio e investimento.

Já comandadas pelo técnico Vadão, as meninas chegaram até as semifinais, mas muito na base da vontade, da dedicação e dos brilhos individuais. Coletivamente o time deixava a desejar justamente no período em que a modalidade teve mais destaque (se não havia grande investimento em categorias de base ou na organização de um bom campeonato nacional, ao menos na seleção houve um bom aporte financeiro). Com muito apoio popular, as meninas foram além do que se esperava e esbarraram em suas limitações e, especialmente nas limitações de quem as comandava (e segue comandando).

Em todas essas campanhas a seleção feminina conquistou o público, ganhou apoio da torcida, foi além do que se esperava, mas esbarrou em suas limitações. As derrotas eram pedidos de ajuda. A cada frustração gritava-se por mais apoio, patrocínios, organização. Só agora o futebol feminino do Brasil começa a engatinhar na formação de um campeonato forte, calendário organizado, desenvolvimento das categorias de base e investimento financeiro. Talvez as conquistas internacionais demorem a chegar, mas não há segredo senão o trabalho de longo prazo.

 

Foto: assessoria/CBF

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