Desesperança, tristeza, nos olhos de brasileiros que nunca ninguém se preocupou perguntar sobre o que eles acham do mundial de 2014

Desesperança, tristeza, nos olhos de brasileiros que nunca ninguém se preocupou perguntar sobre o que eles acham do mundial de 2014


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Fotos Kaique Lopreto

Eles têm algo em comum: transitam no maior centro financeiro do Brasil, estão abaixo da linha da pobreza, são desprezados, sofrem discriminação invariavelmente, vivem um dia de cada vez, são contaminados pela desesperança e ninguém nunca perguntou o que acham da Copa do Mundo no Brasil.

Estes são os excluídos da Avenida Paulista, em São Paulo, que tentam sobreviver pedindo ou trabalhando sob os olhares dos transeuntes de todas as classes sociais, despontando todos os tipos sentimentos e preconceitos da miserabilidade humana.

A menos de dois meses do início do Mundial, os excluídos querem a Copa do Mundo, mas sem entusiasmo, e temem uma segregação entre aqueles com algum poder aquisitivo e daqueles que padecem da benevolência alheia.

A jovem Márcia Maria Ferreira(foto ao lado), de apenas 26 anos, tem uma história que caberia em um livro. Mora na rua, junto ao marido e dois filhos, no Largo São José do Belém, na zona Leste da capital paulista. Foi viciada e cumpriu seis anos de prisão por tráfico de drogas, mas se diz recuperada. Teve cincos rebentos, mas cria apenas dois, pois perdeu a guarda de um para o pai e dois foram adotados por um casal italiano. Dia sim, dia não, é pedinte no cruzamento da Rua Pamplona com o prédio da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

Sempre carregando o seu caçula, Márcia espera por um pacote de fraldas de alguma alma boa e quem sabe uns trocados. Está feliz com a Copa no Brasil, masdiz que a Polícia está barbarizando com os sem teto nas ruas por causa do Mundial e que teme uma ação mais drástica dos mesmos. A boataria das ruas consome quem vive nelas. Espera das autoridades apenas um local para assistir aos jogos da competição com o marido e o seu neném, em segurança e com o mínimo de dignidade.

Situação um pouco diferente vive João Rodrigues (foto à direita), de 71 anos, natural de Piracaia-SP, que tem casa própria em Parada de Tápias, na zona oeste da cidade. O deficiente físico não tem aposentadoria e vive da caridade daqueles que perambulam em frente ao Parque Mário Covas.

O ex-fiscal de ônibus é casado, tem quatro filhos e três netos e afirmou que nunca recebeu a visita de uma assistente social. Ele disseque pretende assistir à Copa em casa, junto à família, e não teme uma ação da polícia para tirá-lo do seu ponto.

Outro que não tem medo é Jair da Souza Dias, de 60 anos. Parecido com o ex-jogador Paulo Cézar Caju, anda pela principal avenida da cidade todos os dias à espera de um trocado. O ex-funcionário da Eletropaulo tem 30 anos de experiência, mas, por uma infelicidade, foi morar nas ruas. A Copa o deixa feliz, afinal a cidade receberá estrangeiros e turistas, mas ele não nutre expectativas na melhora de vida com o evento. Apenas pretende assistir aos jogos em algum ponto da cidade e quem sabe até receber um convite do irmão para dividir um almoço ou jantar ao lado da sua filha.

A junção da família não move, porém, o cruzeirense Elias Martins (foto à esquerda), de 50 anos, mas que aparenta muito mais. Ele diz viver um dia de cada vez, mas em seus olhos exalam a desesperança e a tristeza. Pedinte na esquina da rua Augusta com o Conjunto Nacional, ele conta que muitos o olham com desprezo e às vezes não o “enxergam”. O mineiro gosta de futebol, mas a sua única esperança é almoçar e jantar de vez em quando.

Felipe Augusto (foto abaixo) é engraxate, tem apenas 19 anos, sua família tem casa própria e mora no litoral paulista. Ele optou por morar na rua, pois ainda mantém o vício em cocaína, que pretende largar. O são-paulino não vê diferença se vai haver ou não a Copa, pensa apenas no próximo momento.



O mais agitado de todos os entrevistados era Luis Antonio da Silva Heredia, de 27 anos. Não deixou tirar fotos e mora embaixo do viaduto Vergueiro, mas anda pela Paulista todos os dias. Heredia está preocupado com os boatos, que dizem que a polícia e o Estado vão trancafiar todos os moradores de rua em albergues por três meses e soltar apenas em julho.

Ser presa em albergue não é a preocupação de Maria José, de 79 anos, moradora de São Matheus, zona Leste. Natural de Guaxupé-MG, espera a boa vontade dos passantes por um trocado. Tem como ídolo Pelé, já que é fã do Santos, vai assistirà Copa em casa e ainda espera a visita dos três filhos, quehá muito não a veem.

Fernando Vasconcelos (foto), de 30 anos, tem uma barraca de dormir na entrada do Parque Trianon e cuida de dois cachorros, que o ajudam sobreviver todos os dias. Devido a um problema com o crack, deixou a sua casa na Bela Vista, na zona central, a profissão de desenhista e os três filhos. Mas diariamente vai à recepção do prédio da mãe pegar seu almoço e jantar.


“O crack surgiu para acabar com os menos favorecidos. Mas eleacabou pegando advogados, médicos e outros. Na rua vivemos um dia após o outro. Milhares passam por mim, mil me observam e quinhentos se comunicam comigo pelo olhar", refleteVasconcellos sobre a moradia na rua e as drogas.

O talentoso desenhista ainda não sabe se vai ter Copa, mas promete que no dia da final, em 13 de julho de 2014, vai mostrar ao mundo uma grande surpresa que é o seu ideal de vida.

 

04.04.2014

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