Em 7 de abril de 1985, no GP do Brasil de F1

Em 7 de abril de 1985, no GP do Brasil de F1

Dizem que faz um calor dos infernos no inferno...

Eu destesto calor. 

Tacho do capeta é o nome que talvez melhor defina aquele 7 de abril de 1985 no extinto Autódromo de Jacarepaguá, estreia de Ayrton Senna pela Lotus, seu segundo ano na Fórmula 1.

Antes, acho que vale contar como acabei desembocando no Rio de Janeiro para aquela corrida, a primeira que assisti ao vivo em um autódromo.

Eu fazia cursinho no Anglo-Tamandaré, um lugar mágico e marcante na minha vida, tanto para minha formação estudantil como pessoal. Lá conheci minha ex-mulher, saudosa e querida, com quem tive meu filho maravilhoso.

Lá pelo mês de março, a John Player Special, patrocinadora da Lotus, que havia desembarcado há pouco no Brasil, fez uma promoção e sorteou ingressos para o GP do Brasil de 1985.

Apaixonado por Fórmula 1 desde a madrugada de 24 de outubro de 1976, primeira corrida que tenho lembrança, o cinematográfico GP do Japão que decidiu o título daquele ano e virou o belo filme "Rush", eu tinha certeza absoluta que eu seria um dos felizardos a ganhar aquele, que para mim seria o "Cupom Dourado", à semelhança do que levou Charlie Bucket acompanhado de seu vovô Joe à "Fantástica Fábrica de Chocolate" do Sr. Willy Wonka...

Não tive, pelo menos a princípio, a sorte do bom Charlie, a quem o Destino (com "D" maiúsculo mesmo) presenteou com a moeda encontrada no bueiro bem em frente à doceria com a qual comprou um chocolate, e com o troco levou a barra que mudou sua vida para sempre...

O sorteio dos ingressos aconteceu e eu não fui um dos premiados.

E lá veio o Alexandre, meu amigo também do colegial, que também estudava no Anglo na turma de exatas (eu era da sala de humanas) e, sabendo do meu desejo, colocou o ingresso em minhas mãos, de presente!

Claro, na volta trouxe uma recompensa pra ele: boné e camisa oficiais da Lotus, como esta que estou usando na foto, que ilustra a crônica.

Agora, voltando ao "tacho do  capeta".

Era minha segunda vez no Rio de Janeiro. Havia estado lá um ano antes para assistir meu Corinthians ser derrotado pelo Flamengo e dar o troco magistralmente no Morumbi, pelo Brasileirão de 84.

Por sorte, o ar-condicionado do "La Cache", funcionava bem.

"La Cache" era um motel na Barra da Tijuca que havia sido transformado em hotel para receber os turistas que estavam no Rio para o GP.

Cama redonda, espelho no teto, mas isso não vem ao caso...

Um bom som ambiente, com um FM estéreo honesto que embalou minhas duas noites cariocas aos som de "Crazy For You*", recém lançada pela Madonna.

A música, aliás, muitos anos depois fez parte da trilha sonora do saboroso "De Repente 30", uma histórinha de amor que eu daria não um, mas todos os meus dedos para ter vivido, se a menina de blusa de nylon lilás do colegial tivesse ficado comigo.

Não apenas na noite do Baile de Formatura no "Círculo Militar", mas para sempre.

O Rio de Janeiro estava coalhado de preto e dourado. As propagandas de cigarro eram permitidas até nos macacões infantis e brinquedos piratas vendidos em frente ao autódromo.

Nosso ônibus de excursão demorou uma eternidade para chegar, e só nos restou sentar bem embaixo, onde a visão era pior, mas o barulho dos motores compensava.

Aliás, interessante lembrar, que apesar de serem turbo, aqueles propulsores eram bem mais ruidosos que os atuais.

Por outro lado, a infra-estrutura (?) de Jacarepaguá para o público do retão, acomodado (?) nas arquibancadas de madeira, era uma lástima. Aliás, dizer que era uma lástima é suavizar nas tintas...

Não havia nenhum banheiro por perto e era impossível, depois de se acomodar, sair e voltar para o mesmo lugar.

Então, aqueles que estavam nos últimos degraus da arquibancada, prevenidos, estavam munidos de sacos plásticos onde faziam xixi e jogavam para baixo, verdadeira guerra química a que fomos todos nós submetidos naquele dia.

Uma selvageria sem precedentes, mesmo para mim, acostumado a jogos de futebol em estádios precários.

A menina que estava atrás de mim, a bonitinha da foto acima, disse que nunca mais voltaria a Jacarepaguá, e que iria rogar uma praga para que aquele autódromo fosse demolido, implodido, acabasse...

Hoje, sabendo o que aconteceu ao lugar, só posso ter uma certeza sobre aquela menina: era uma bruxa graduada.

Na pista, Senna largou atrás de seu companheiro de equipe, Elio de Angelis (quarto e terceiro colocados no grid, respectivamente), e o brasileiro da Lotus abandonou, A pole foi do Alboreto com sua Ferrari, Prost, de McLaren, ganhou, Alboreto terminou em segundo e De Angelis em terceiro. Piquet também ficou pelo caminho, logo no começo da prova, em seu último ano na Brabham.

Quanto a mim, duas coisas interessantes a lembrar daquele dia: ainda tenho o boné e a camisa guardados, em ótimo estado, e não vendo por dinheiro nenhum.

E o melhor, passados 35 anos, além de ter vivido boas histórias, é que a camisa ainda me serve direitinho...

ABAIXO, CLIPE DE "CRAZY FOR YOU", MÚSICA DA MADONNA QUE EMBALOU MINHAS NOITES CARIOCAS NO INDEFECTÍVEL "LA CACHE".

* "Crazy For You" integra a trilha sonora de "De repente 30", de 2004, um filme delicioso com uma história de amor que eu gostaria de ter vivido...

A Lotus de Senna no extinto Jacarepaguá em 1985. Foto: Divulgação

 

 

 

 

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