Clique aqui e entenda o caso

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Imagem: Túlio Nassif/Portal TT

A redação do Portal Terceiro Tempo recebeu no dia 19 de junho de 2015, o seguinte e-mail do Dr. Filipe, sobre a Ação do atleta Kauê x DIS e o Clube Atlético Penapolense. Abaixo, confira o conteúdo:

Milton Neves, obrigado mais uma vez pelo espaço. O caso é grave e comovente. Tenho hoje quase 400 processos ativos somente de atletas contra clubes. Nenhum processo até hoje me "tocou" e comoveu como este. Em certa altura, precisei parar, tamanha era o sentimento de angústia por me "transportar para a pele" do menino.

Tentei ao máximo reduzir para explicar a situação. Segue anexo cópia integral do processo e documentos.

Atleta Kauê Siqueira Santos iniciou na base do Santo André. Em 2011 DIS adquiriu seus direitos econômicos e foi firmado entre DIS e Kauê, Contrato de Parceria, Desenvolvimento e Investimento em Carreira Desportiva de Atleta Profissional.

Neste contrato mencionava os valores a serem pagos ao atleta. Foram pagos R$50.000,00 na assinatura do contrato, e mais R$5.000,00 mensais, nos termos da Cláusula Terceira “caput” e parágrafo único. Em contrapartida, a DIS seria detentora de 50% dos seu “direitos econômicos”, nos termos da Cláusula Quarta.

Ademais, o atleta era impedido de assinar contratos com clubes sem a anuência da DIS, nos termos da Cláusula Sexta, o que claramente demonstra a subordinação do atleta às ordens hierárquicas da DIS.

No mesmo dia da assinatura do referido contrato, foi assinado Instrumento Particular de Representação Esportiva, onde a DIS indicou os Srs. Guilherme de Miranda Gonçalves e Espedito Júnior da Silva, ambos empresários de futebol, para serem “agentes” do Kauê. Ambos são diretores/funcionários da DIS.

Era obrigado a aceitar e acatar as decisões dos agentes e da DIS, tanto que na cláusula terceira cravou-se que se o reclamante firma-se novo contrato de trabalho sem participação da DIS e seus agentes, deveria indeniza-los em R$500.000,00, nos termos da Cláusula Terceira.

Por determinação da DIS e seus agentes, assinou contrato com o Corinthians/SP, Internacional/RS e Guaratinguetá/SP. Os salários eram de R$4.000,00 e complementado em R$1.000,00 pela DIS, por força da Cláusula Terceira, §3º do contrato firmado entre DIS e reclamante.

São cinco os pressupostos para a caracterização da relação de trabalho:

Pessoalidade

Não eventualidade

Onerosidade

Subordinação

Lucratividade

No presente caso é evidente o vínculo de emprego: a relação é pessoal, entre Kauê e DIS; não eventual, sendo pactuado em contrato a continuidade da relação; a reclamada pagava uma contraprestação mensal de R$5.000,00; o reclamante somente poderia assinar contrato sob ordem e comando da DIS. Caso assinasse sem autorização, deveria pagar uma astronômica multa; e por fim em negociação do reclamante, a reclamada receberia altos lucros.

Isto está previsto no art. 2º, 3º, 4º e 6º da CLT.

No início de 2013, a DIS firmou parceria com o CA Penapolense, onde a DIS colocaria seus atletas no clube, como “vitrine” para valorização, e pagariam parte dos salários, sendo que, com a venda de algum atleta, DIS e CA Penapolense dividiriam os lucros.

Assim, em nosso entendimento, foi formado um grupo econômico, nos termos do art. 2º da CLT, e a responsabilidade solidária da DIS no caso.

Ou seja, além de existir, ao nosso entendimento, relação de emprego entre o Kauê e a DIS, a DIS era parceira do CA Penapolense, e logo, aquele que detém o lucro, deve responder pelo prejuízo, sendo assim, responsável solidariamente as dívidas com o Kauê.

Em 24/05/2013 por determinação da DIS, então parceira do CA Penapolense, firmou contrato com o CA Penapolense. A vigência do contrato encerraria em 30/05/2014. O salário ajustado era o mesmo pactuado na Cláusula Terceira, §3º do contrato firmado entre DIS e reclamante. O CA Penapolense pagaria R$1.500,00 e o restante, no valor de R$3.500,00 seriam pagos pela DIS, que além detentora dos Direitos Econômicos do reclamante, responsável por sua carreira, era parceira do CA Penapolense, e pagaria os salários do reclamante e de outros atletas, conforme supra narrado.

Devido à capacidade técnica, com futuro promissor, tido como grande promessa, no Contrato Especial de Trabalho Desportivo ficou estipulado o valor da Cláusula Compensatória do reclamante em R$2.000.000,00 (dois milhões de reais), máximo permitido por Lei, para negociações com clubes do Brasil e U$D5.000.000,00 (cinco milhões de dólares), equivalente a R$16.500.000,00 (dezesseis milhões de reais) para negociações com clubes do exterior.

Após o jogo da reclamada contra o Marcílio Dias/SC em 07/06/2013 pelo Campeonato Brasileiro, foi concedido folga a todo elenco da reclamada, que deveriam se reapresentar aos trabalhos em 10/06/2013, para preparação da partida contra o Santo André/SP também pelo Campeonato Brasileiro. O reclamante reside em São Paulo/SP, capital de nosso Estado, e aproveitou a folga para rever os familiares que a dias não via.

O reclamante deveria se reapresentar no início da tarde do dia 10/06/2013, segunda feira, pois os treinos e reapresentação do elenco estava marcado para as 16hs.

Em 10/06/2013, ao deslocar-se de sua residência para seu local de trabalho em Penápolis/SP, o reclamante sofreu grave acidente automobilístico, na Rodovia Mal. Rondon, na altura da cidade de Lençóis Paulista/SP, passagem obrigatória entre São Paulo e Penápolis. O caso equipara-se ao acidente de trabalho, nos termos da Lei 8.213/91, em seu art. 21, alínea “d”:

d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.

Sofreu traumatismo craniano encefálico. Foi socorrido pelo corpo de bombeiros e encaminhado para o Hospital Público de Lençóis Paulista. Em decorrência da gravidade da situação, familiares requisitaram aos seus empregadores que deslocassem-no para outro Hospital, de melhor qualidade. Temia-se, naquele momento, o falecimento do reclamante.

DIS e CA Penapolense informaram aos familiares que o SUS faria o tratamento do reclamante, e que não interviriam, pois era obrigação do Estado cuidar do reclamante. Em 11/05/2013 houve piora no quadro clínico do reclamante, sendo encaminhado pelos médicos do Hospital de Lençóis Paulista ao Hospital de Base de Bauru. Naquele momento grave de sua vida, o reclamante foi brutalmente golpeado pelo abandono de seus empregadores.

O atleta estava “em coma” e com “ventilação mecânica”, popularmente chamado de “respiração por aparelhos.”

A reclamada CA Penapolense sabia da gravidade do acidente. O próprio Presidente da reclamada, médico por profissão, concedeu entrevista para a Globo e mencionou:

“Seu quadro clínico é grave...”

http://globoesporte.globo.com/sp/sorocaba/noticia/2013/06/atleta-do-penapolense-capota-carro-em-rodovia-e-esta-internado-em-uti.html

Porém nada fizeram. Abandonaram o reclamante a sua sorte e ao tratamento do SUS. O atleta passou por intervenção cirúrgica. Sofreu Neurocirurgia, em decorrência do Trauma Crânio Encefálico.

Em 23/06/2013, foi inserido em seu prontuário médica, por uma das enfermeiras que atendiam o reclamante que:

“Paciente encontra-se em repouso leito padrão, coma profundo, responde estímulo verbal da enfermagem com expressão facial.”

Em coma, alimentava-se através de sonda nasal. Em 26/06/2013, tentou-se alterar a alimentação para via oral, sem aceitação do organismo. Foi então repassada à alimentação por sonda naso enteral.

Em 27/06/2013, a nutricionista do Hospital, Karin Perpétuo, descreveu:

“Paciente em uso de SNE, recebendo dieta enteral hiperproteica, apresentou perda de peso, risco nutricional).”

Encontrava-se sob ventilação mecânica, em decorrência da incapacidade de seu organismos manter o ciclo respiratório.

“Saiu” do coma no início de julho de 2013. A fala e a coordenação motora do reclamante estavam fortemente comprometidas. O reclamante foi encaminhado à fonoaudiologia do Hospital.

Após quase 30 dias na UTI em coma, recebendo o tratamento único do SUS, recebeu alta em 06/07/2013, conforme receituário do Hospital de Base de Bauru:

“...paciente em epígrafe permaneceu internado 11/06/2013 à 06/07/2013, devendo permanecer afastado de suas atividades por tempo indeterminado...”

Após o acidente foi abandonado pelas reclamadas, que após verem que não teriam como ter um proveitoso lucro com o atleta, largaram à sua própria sorte.

Após a alta, todo tratamento, consultas, fisioterapias, exames, foram custeadas pelo atleta com auxílio de sua família e amigos, que sensibilizados com sua situação, o ajudavam. Realizou exame de tomografia do crânio, em 04/09/2013, que constatou haver assimetria do ventrículo lateral esquerdo:

“4 – Ectasia assimétrica do ventrículo lateral esquerdo em relaão ao direito.”

Em 03/02/2014 efetuou exame de ressonância magnética do encéfalo. O laudo apontou a existência de formação de cisto no cérebro do reclamante:

“Formação cística intra-ventricular em corno posterior do ventrículo lateral esquerdo.”

O reclamante sentia problemas em sua visão. Em 07/02/2014 efetuou exame, no qual o oftalmologista ponderou:

“Olho esquerdo manteve fixo, mas a máquina não conseguiu achar um ponto cego.”

Cabe-nos esclarecer: o ponto cego, conhecido como “exotoma”, é uma área da retina que não contém receptores de luz. Corresponde a porção da retina onde se insere o nervo óptico, que transmite os estímulos nervosos da camada plexiforme ao córtex cerebral.

Todo o tratamento recebido foi custeado pela sua família. O próprio médico do clube, Dr. Mauro Moreira, CRM n° 43870, irmão do Presidente do CA Penapolense, em 28/07/2014, reclamado informou ao INSS que o atleta estava em recuperação na Santa Casa de São Paulo:

“Atualmente faz tratamento no ambulatório de medicina de esporte da Santa Casa de São Paulo.”

No mesmo receituário, informou ao INSS que:

“...não esta reabilitado para voltar ao futebol profissional. Solicito reconsideração da alta desde fevereiro de 2014”

Em 17/12/2014 foi atendido pelo médico do clube, Mauro Moreira, CRM n° 43870, irmão do Presidente do CA Penapolense. No laudo constou que tinha problemas na coordenação motora, dificuldade cognitiva e para expor pensamentos. Por fim, informou que não teria condições para voltar  ao futebol profissional:

“Apresenta ainda déficit para controle motor fino, dificuldade cognitiva e para expor pensamento. Recebeu alta em fevereiro/2014 e não tem condições para voltar ao futebol profissional.”

Grande parte da reabilitação ocorreu na Santa Casa de São Paulo, conforme atestado do Hospital, em anexo.

Tinha dificuldade na fala e na coordenação motora. Em 15/07/2014 o reclamante atendido pela Profa. Dra. Liane Hulle Catani, CRM n° 55883, que baseado nos exames clínicos e físicos constatou que a coordenação motora do reclamante estava comprometida:

“...não encontramos outras alterações, além das sequelas motoras finas...”

“Melhor complementar com tratamento específico.”

 Conforme prescrito pela Médica especialista na área, o reclamante necessitava de tratamento específico. Mais uma vez as reclamadas quedaram inertes, abandonando o reclamante a sua sorte.

DIS e CA Penapolense foram notificadas para que pudessem auxiliar na recuperação do reclamante, invocando ainda o princípio da dignidade da pessoa humana. Sem respostas.

Ao perceberem que não conseguiriam negociar e exigir a multa do contrato DIS e CA Penapolense abandonaram o atleta a sua sorte, a mercê de tratamento no SUS e ajuda de amigos.

Necessitava de tratamento específico para sua reabilitação para ao menos, a vida cotidiana. O “tratamento específico” despendido por DIS e CA Penapolense foi obriga-lo a treinar sozinho, sem supervisão de nenhum profissional. Por meses o reclamante treinava sozinho, dando voltas em volta do gramado de um dos campos de treinamento da reclamada.

O reclamante necessitava de tratamento específico, sendo indicado o Physio Institute, clínica especializada na reabilitação de profissionais do esporte, sob comando do renomado Dr. Turíbio Santos Leite.

Segundo o instituto especializado, eram necessárias 50 sessões de fisioterapia específica para que o atleta pudesse se reabilitar, a priori, para a vida comum. O valor do tratamento era de R$10.750,00. Ocorre que DIS e CA Penapolense se negaram referido pagamento, indicando ao atleta a manutenção do tratamento no SUS.

O tratamento esta sendo pago por familiares e amigos.

Fato é que o atleta teve que, precocemente encerrar sua carreira, com apenas 22 anos de idade.

Importante ressaltar que se em tempo, após o grave acidente, DIS e CA Penapolense tivessem arcado com as despesas de um tratamento condizente, ou no mínimo necessário, se tivessem custeado um tratamento específico como foi requerido pelos médicos, a realidade do atleta, hoje, seria outra.

PEDIDOS DO PROCESSO

Seguro Obrigatório art. 45 da Lei Pelé e cláusula terceira “e” do contrato de trabalho (13 salários) = R$65.000,00

Reembolso das despesas médicas – art. 45, §2º da Lei Pelé = R$30.000,00

Estabilidade Provisória- art. 118 da Lei 8.213/91 = R$41.666,66

Lucro Cessante – art. 402 e 949 do Código Civil = R$1.114.000,00

Pensão Vitalícia – art. 950 do Código Civil = R$2.880.000,00

Indenização Acidente de Trabalho (Abandono) = R$100.000,00

Dano Moral = R$50.000,00

Diferença Salários = R$84.000,00

Cláusula Compensatória Desportiva = R$40.000,00

Férias = R$13.000,00 (nunca foram pagas as férias)

13º Salário = R$10.500,00 (nunca foi pago um único 13º)

TOTAL = R$4.428.166,66 (quatro milhões, quatrocentos e vinte e oito mil, cento e sessenta e seis reais e sessenta e seis centavos).

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