Tiago Volpi e Jordi provam da amargura dos lances enigmáticos do futebol, que enterraram grandes atuações no fim de semana. Foto: UOL

Tiago Volpi e Jordi provam da amargura dos lances enigmáticos do futebol, que enterraram grandes atuações no fim de semana. Foto: UOL

É como um parto ir ao jardim esperando o espinho, entrar na sala de Recursos Humanos ou ser chamado pelo chefe na “salinha”; todo dia de rodada deve ser igual para um goleiro, mente em espiral pensando em como pegar tal bola, aquele chute, cortar um cruzamento e, o pior!, o que responder se falhar. Embora da classe dos seres humanos, os goleiros compõem uma casta distinta da sociedade global, pois raramente são perdoados. Não importa se você voou 52 vezes para impedir um gol se um titubeio, uma visão turva, vertigem ou arrependimento lhe levarem um gol pelas costas. Lembrei-me dos meus tempos embaixo das traves ao ver neste fim de semana Tiago Volpi, do São Paulo, e Jordi, do CSA.

Enquanto narrava o Choque-Rei no Morumbi, no último sábado, notava o que se passava no Espírito dos tricolores diante do líder do Brasileirão. Após um mês em preparação, mais  sangue na veia dos são-paulinos esperançosos por derrubar mais de 30 jogos de invencibilidade do rival Palmeiras. E desde o primeiro minuto, o exército de Cuca partiu para cima, certos de que, quando o adversário atacasse, Tiago Volpi estaria lá. E esteve na cara de Deyverson pelo menos duas vezes evitando gol certo; outra feita, saltou para pegar um chute de Gustavo Scarpa. Já estava na lista dos comentaristas como craque do jogo quando a Física resolveu desafiar o arqueiro no segundo tempo. 

Dudu chuta no começo da área, a bola toca no pé de Reinaldo e sobe, sobe até alcançar a linha de visão de Tiago Volpi que viu um eclipse. Era o esférico tomando a forma do refletor do estádio, ficou escura como a lua que entra à frente do sol num desses momentos (cada vez mais frequentes, diga). Assustado, o goleirão correu para trás, deu com as costas na trave, enquanto a bola, que lá já tinha beijado, bateu-lhe no ombro e entrou. O que você pensaria naquele momento, vestindo a camisa um? Obra do capeta, só pode! Estava tudo bem até um minuto atrás, de repente, o que essa bola foi fazer no alto, como me encobriu, Pai do Céu? O jogo terminou empatado, e o Verdão seguiu de queixo erguido invicto. 

No dia seguinte, Jordi viveu semelhante situação pelo CSA das Alagoas ao enfrentar o Corinthians, na Arena de Itaquera. Ex-goleiro do Vasco, o jovem arqueiro trabalhou como poucos, já que seu time decidiu abdicar do jogo e apenas se defender. Falta do Sornoza e eu gritava… JORDIIIIIII! Chute do Clayson, o mesmo. Bola viva na área, sai o goleirão para defender. Até os 33 minutos do segundo tempo, era ele a garantia de um precioso ponto ao penúltimo colocado do Brasileiro, que estava estreando técnico e uns 15 jogadores (força de expressão). Não contava o torcedor alagoano com o destino que persegue os que jogam de luva…

Mauro Boseli entrara há poucos minutos no lugar de Ralf para aumentar a presença artilheira na área do “Azulão”. A chegada do argentino confundiu os zagueiros Luciano Castan e Alan Costa, abrindo caminho para um combalido Timão que mal conseguia chegar perto do impávido colosso Jordi, até que, aos 33 minutos, sai a jogada numa troca de posições entre Vágner Love e o atacante recém-chegado. Boseli passa a bola entre as pernas de um dos zagueiros, o “Artilheiro do Amor” gira na pequena área e manda um balaço para o alto. Dizem os boleiros que. naquele ponto, ou você chuta no ângulo ou a bola cai na arquibancada. Claro que a bola entraria, era o destino dos goleiros, bola na gaveta e... Corinthians um a zero.

Dizem que onde goleiro fica nem grama nasce, maldade do universo com essa gente que aprendeu com Barbosa, em 1950, a sofrer sem chorar. Esticando-se, pulando, gritando, indicando e pelejando, são eles a última barreira que evita a alegria de milhões. Talvez seja por isso a contra-carga invejosa do Universo para os que evitam o gol, seja viver eternamente na tensão do que pode dar errado - e normalmente dá.

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