Nem com licença poética é possível associar o frasco à categoria... Foto: Divulgação

Nem com licença poética é possível associar o frasco à categoria... Foto: Divulgação

Estreei como espectador de um GP de Fórmula 1 em 1985, no GP do Brasil, em Jacarepaguá.

O que me levou ao extinto autódromo carioca merece ser mencionado.

Naquele ano eu fazia cursinho pré-vestibular no Anglo, unidade Tamandaré.

O lugar onde encontrei a minha primeira namorada, única esposa, mãe do meu único filho.

Apaixonado por F1, fiquei de olho na movimentação das meninas vestidas de preto e dourado (eu ainda não namorava, friso) que começaram a transitar pelo pátio distribuindo cupons.

Elas representavam a John Player Special, marca de cigarros que patrocinava Ayrton Senna em seu ano de estreia na Lotus.

Hoje, apesar dos tempos sombrios que vivemos no Brasil, suponho impossível uma marca de cigarros fazer uma promoção em um ambiente de ensino.

Mas naquele 1985 foi permitido, e os cupons sorteados foram contemplados com ingressos para o GP do Brasil no Rio de Janeiro.

Não ganhei, mas meu amigo Alexandre Pinheiro faturou e me deu de presente.

Presentão, de verdade. Em troca eu lhe trouxe uma camisa da Lotus, era o mínimo que eu poderia fazer para retribuir tamanha generosidade.

O Alexandre havia estudado comigo no colegial e tínhamos uma boa amizade.

Sou grato até hoje.

De todas as sensações que senti naquele fim de semana carioca de calor absolutamente insuportável (detesto calor), nenhuma foi mais sublime do que a olfativa.

Ok, o som dos carros era maravilhoso, o visual deles também. Mas o cheiro da gasolina e da borracha queimando no asfalto quase derretendo superavam aquilo que a audição e a visão poderiam me dar de melhor.

Em muitos outros GPs, agora em Interlagos, tive essa mesma sensação, do delicioso cheiro do combustível, principalmente.

Algo que mudou totalmente na "nova" F1.

Estive a trabalho no GP do Brasil deste ano e constatei, bem de perto, que o cheiro do combustível está horrível.

Muitos reclamaram do som mais baixo dos motores (o que é verdade e triste), mas eu fiquei mais indiganado acerca do olfato novo da F1...

Falando nisso, a modernosa F1, hoje liderada pelo Liberty Media, resolveu "jequitizar" e lançou três perfumes "inspirados" no mundo da F1.

Sem poder opinar sobre o conteúdo líquido (o lançamento será em março de 2020), fiquei boquiaberto (negativamente) com o design dos frascos.

Incumbiram um designer chamado Ross Lovegrove para a empreitada, que criou as pérolas (?) em impressoras 3D.

Designers costumam ser muito criativos, mas também excêntricos.

Alguns viajam na maionese, supondo que conseguirão minimizar as mazelas mundanas desenhando uma "originalíssima" poltrona ou um plafon que "até" funciona...

O tal Lovegrove parece ser totalmente desinformado sobre F1.

Dá a impressão de uma criação de quem estava refestelado em sua alcova, borracho...

Os frascos em nada remetem à F1.

Nem com licença poética.

Um horror.

Os nomes também são bizarros: 

Agile Embrace (Abraço Ágil); Fluid Simmetry (Simetria de Fluídos) e Compact Suspension (Suspensão Compacta).

A fragrância, bem, esta poderia ao menos lembrar a da gasolina que eu inspirei em Jacarepaguá/85.

Seria uma boa recordação para compensar a feiura dos potinhos bolados pelo designer.

Os frascos criados pelo designer Ross Lovegrove: Agile Embrace; Fluid Simmetry e Compact Suspension. Haja licença poética para enxergar alguma proximidade com a F1... "Fluid Simmetry" (o do meio), por exemplo, parece uma caixa toráxica com um único pulmão. Foto: Divulgação

 

Eu em Jacarepaguá/1985, para o GP do Brasil de Fórmula 1. Até hoje tenho a camisa (que me serve perfeitamente) e o boné. Eu usava desodorante Italian Pine e o cheiro da gasolina era uma delícia. Foto: arquivo pessoal de Marcos Micheletti

 


  


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