Um dos mais destacados narradores esportivos brasileiros, Luiz Alfredo acumula transmissões marcantes na carreira e muita história para contar. Em mais de 30 anos de profissão, cobriu quatro Copas do Mundo e quatro Olimpíadas, além de Fórmula 1, mundiais de vôlei, basquete, boxe… A lista é longa, mas parou de crescer depois que ele deixou a Rede TV!, em 2012, em que realizou seu último trabalho. Pouco depois, Luiz Alfredo adquiriu uma hidrocefalia (acúmulo de líquido dentro do crânio) e não exerceu mais sua profissão, aposentando-se dos microfones.
Em entrevista ao UOL Esporte, Luiz Alfredo relembra o momento em que foi parar na TV Globo. A oportunidade surgiu depois que pediu demissão da TV Record por conta de um desentendimento com Silvio Luiz, hoje na Rede TV!.
"Eu fui fazer um jogo de vôlei com o Luciano do Valle no Rio de Janeiro, pela Record, como repórter, e não houve o jogo por causa de um puta temporal, e o jogo foi adiado e nós voltamos para São Paulo. Eu voltei no primeiro avião, preocupado com a minha esposa que não estava legal naquela época, e antes de eu ir para o Rio de Janeiro eu falei para o Silvio Luiz: `Se você puder não me colocar nos próximos jogos eu te agradeceria porque em casa estão precisando de mim`, e ele falou: `Não, tudo bem`. Quando eu voltei, eu passei na Record estava lá a escala: trabalhar dois jogos no Rio de Janeiro. Poxa vida, eu pedi para ele, e era uma situação delicada, e eu fiquei tão puto que eu tive uma briga com o Silvio Luiz e pedi demissão", conta.
Luiz Alfredo recorda que logo em seguida foi falar com Paulinho Machado de Carvalho, filho de Paulo Machado de Carvalho e na época "manda-chuva" da TV Record. Não adiantou, mas o desemprego durou pouco graças à ajuda de um amigo de seu pai, o também lendário narrador Geraldo José de Almeida.
"Eu fui falar com o Paulinho e ele falou: `É, é fogo, o Silvio é assim mesmo, você tem razão`. Eu fui falar com o Dr. Paulo e ele me falou: `Olha, aí não tem jeito, ele [Silvio Luiz] é o gerente`. O que eu fiz? Liguei para algumas pessoas e avisei: estou saindo da TV Record. Aí um cara que trabalhou muito com o meu pai na época, o Glaycon Ferreira, em meia hora me ligou de volta. `Olha, eles mandaram você vir aqui, o Boni quer te contratar`. Pô, eu fiquei desempregado uma hora, porque Deus é grande, aí eu fui para a TV Globo de São Paulo. Mandaram uma fita minha e eles assistiram e mandaram me contratar. Dali um mês começou o Campeonato Brasileiro e a minha estreia foi na abertura, Flamengo e Palmeiras no Maracanã", acrescenta.
Esta, aliás, não foi a primeira desavença entre Luiz Alfredo e Silvio Luiz, profissionais que se encontraram com bastante frequência ao longo da carreira.
"No Pan-americano de não lembro que ano, quando eu comecei na TV Record, a Record mandou uma equipe para cobrir, e evidentemente eu contava com a minha participação nisso, mas o Silvio Luiz, que era o gerente de Esporte lá, já estava meio bronqueado porque o Paulinho estava querendo que eu seguisse o gênero do meu pai, e o Silvio Luiz não me botou. Eu reclamei, comentei com ele: `Pô, que pena, não`? Naquela época tinha o Silvio Luiz, o Luciano do Valle e eu, e para o Luciano do Valle não fazer futebol o Silvio Luiz contratou o Fernando Solera, porque aí ele mandou o Solera para Caracas para fazer o futebol, porque o Silvio Luiz não queria dar essa colher de chá para o Luciano do Valle, por ciúmes, e quando eu falei: `Pô, Silvio, que pena que eu não fui`, eu reclamei mesmo, e o Silvio falou: `Ah, vai se foder, você vai trabalhar no stand-by nos Jogos Pan-Americanos`, então o Silvio Luiz me colocou para fazer o stand-by, que é o cara que fica no Brasil e, se pifa alguma coisa, ele é acionado. E para mim não foi problema. A primeira narração de stand-by que eu fiz foi no futebol, Brasil x Uruguai, e o som estava horrível, aí o Paulinho pediu para eu entrar. Foi meio desagradável porque o Silvio Luiz apareceu lá e queria pegar o microfone para ele, e o microfone ninguém arranca das minhas mãos [risos]", afirma Luiz Alfredo.
Procurado pelo UOL Esporte, Silvio Luiz confirma a história que acabou gerando o pedido de demissão de Luiz Alfredo, mas lembra que não tinha poder para decidir sobre a escala. Segundo ele, isso cabia ao chefe `Paulinho`.
"É verdade, mas eu não podia fazer nada sem ordem do seu Paulinho. Aliás, quem fazia as escalas era o Seu Paulinho, não era nem eu. E ciúmes do quê cara? Eu não tenho ciúmes de nada, eu fazia o que o seu Paulinho mandava, mais nada. Naquela época, você não tinha tanta autoridade como tem um chefe hoje, aliás, eu não sei se chefe hoje tem alguma autoridade. Eu era empregado, então tinha que obedecer", esclarece Silvio Luiz, que além de minimizar a `confusão` ainda fez elogios ao ex-colega de profissão.
"Ele foi um belíssimo narrador, muito parecido com o pai, que foi excelente narrador. Aliás, o pai foi muito melhor que ele porque é difícil você conseguir manter a mesma qualidade, mas o Luiz Alfredo foi um belíssimo narrador, um excelente profissional e um belíssimo colega também", completa.
Apesar das histórias, Luiz Alfredo também não vê Silvio Luiz como um inimigo: "Na realidade, a relação com o Silvio Luiz não era uma coisa amistosa, eu também não aceitava muito isso. O Silvio Luiz não me aceitava narrando, de uma certa forma era isso. Ele até tinha o direito de não querer. Eu nunca tive uma relação íntima com o Silvio. A gente cruzou umas duas ou três vezes no aeroporto, nos cumprimentamos, mas nada de solidariedade. E eu nem esperava isso".
VEJA MAIS TRECHOS DA ENTREVISTA:
O início de tudo: "comecei fazendo reportagem de campo"
Não fiz rádio, não. Eu fui direto para a televisão. No dia em que eu fui cumprimentar o Dr. Paulo [Paulo Machado de Carvalho), o Paulinho, filho dele, que era "manda-chuva" da Record, perguntou: `Escuta, não vai trabalhar aqui`? Eu falei: `Olha, eu tenho um emprego fixo (na Light, hoje Eletropaulo]`, e ele falou: `Não tem problema, trabalha de noite`, e foi o que aconteceu. Eu trabalhava de dia na Light e, quando terminava o expediente, eu ia para a Record. Eu comecei fazendo reportagem de campo, mas foi por pouco tempo. E logo em seguida o Paulinho me colocou para narrar, era a Copa São Paulo de futebol júnior, em janeiro de 77.
Olimpíadas 84: "Um dos momentos mais emocionantes da carreira"
Eu fui para fazer o vôlei nas Olimpíadas de 84 em Los Angeles. Nós fizemos a primeira transmissão ao vivo de Cuba, e eu estava lá conversando com a coordenação, todo mundo animado e tal, o cenário fechado, bonito, ar-condicionado, e aí pifou o áudio do Brasil, e eu fiz o chamado `voo cego`. Eu falei para o pessoal: `Eu não estou ouvindo vocês, mas vocês devem estar me ouvindo porque, se não estivessem, já teriam se comunicado. E não tinha celular, nada. Aí eu pensei: `Eu vou fazer a transmissão como se tudo estivesse normal`, eu já sabia mais ou menos o esquema do vôlei, `eu vou seguir o padrão, aí daqui a três minutos vou começar a transmissão`. Eu falei três minutos para dar um aviso para os caras, e foi o que eu fiz, o voo cego. Eu chamava o comercial na volta do intervalo do set, fiz como se estivesse tudo uma maravilha, mas sem saber nada, sem a mínima resposta, e quando terminou a transmissão, eu lembro que naquela época a deixa era falar `Olimpíadas`, e eu falei: `Rede Globo, Olimpíadas 84, cobertura total na Globo`, e quando eu fiz isso, soltei a deixa e ouvi o retorno do Rio de Janeiro, do car… Foi um dos momentos mais emocionantes da minha carreira, deu certo.
A saída da Rede TV!: "maior sacanagem"
A Rede TV! foi a maior sacanagem do mundo porque o Marcelo Carvalho falou: `Vai ficar só um narrador, e fica o Silvio Luiz`, e o Silvio chegou depois de mim. Sempre essas cruzadas com o Silvio Luiz… [risos]. Na verdade, a minha carreira terminou ali, não dava mais.
As maiores coberturas da carreira
Além das quatro Copas do Mundo eu fiz Jogos Olímpicos, Los Angeles-84, Seul-88, Barcelona-92 e Atlanta-96, fiz uns 20 GPs de Fórmula l. Mundiais de basquete, vôlei, boxe (Tyson e Popó), Mundial interclubes em 92 em Tóquio… Ouro (olímpico) do Aurélio Miguel (no judô em 1988), ouro do vôlei masculino nas Olimpíadas de 92…
O narrador preferido da atualidade
O Milton Leite. É que eu fiquei muito amargo, sabe? Eu fiquei muito exigente com os caras, eu quero que a narração dos caras seja perfeita. Hoje, por exemplo, tem muito berro, os diretores acham que têm que berrar para dar audiência. Gosto também do Jota Junior. Agora aqueles que eu não gosto… Ah, eu não vou falar, não, deixa pra lá. Uma coisa me consolou em ficar grudado na televisão, ficar vendo de tudo, é que, muitas expressões que eu usava, o povo usa. A linguagem que eu adotei é muito usada hoje; quando falam, por exemplo, `abre o compasso`, todo mundo fala.. O `pediu e recebeu`, e por aí vai.
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