Um pouco do que aprendi com RR em dois anos ensina a enxergar a vida e o futebol com leveza e sorriso

Um pouco do que aprendi com RR em dois anos ensina a enxergar a vida e o futebol com leveza e sorriso


Jogar uma partida de futebol é como entrar em um túnel pela primeira vez. Sabe-se como se entra, mas nunca o está esperando no final. É assim no esporte, é assim na vida, também na música. Ao sair do camarim e ir ao palco, não se sabe como o show terminará, com aplausos ou vaias. O mais engraçado e irônico é que, muitas vezes, nestes três assuntos, perder pode ser a chave da vitória. É com coragem que digo isso a você em um dia de quartas-de-final de Campeonato Paulista.

O tal "mata-mata" que começa hoje, com São Paulo x Mirassol e Palmeiras x Santo André (transmissão da rádio BandNews FM mais tarde) é absolutamente distinto. É o primeiro na história logo após um hiato de mais de 100 dias sem futebol. Em meio a um país dilacerado por quase 90 mil mortes e 2 milhões de infectados pelo traiçoeiro coronavirus, a nossa panaceia é viver o futebol com o tapa-olho da imaginação. Não tem público, mas inventamos; o luto toma conta da gente, mas em 90 minutos, o apagamos da nossa memória.

Lá dentro do campo, atletas e jogadores tem as mesmas dúvidas, angústias e tristezas (uns mais, outros menos) que nós, apreciadores do lado de cá. Porém, veja só, serão cobrados por suas eliminações em jogo único, com apenas duas partidas antes do precipício. É o "velho normal" do futebol e do esporte. Vamos analisar o jogo lento do Corinthians, a falta de viço do Palmeiras, a letargia são-paulina e o desconexo desempenho do Santos. As críticas virão duras, o "acabou a pas (sic)", também. Esquecemos que, dos tropeços nascem as grandes vitórias.

O Brasil de 1958 nasceu do Maracanazo, o São Paulo de Telê, das quedas em 1989 e 1990, o Corinthians campeão do mundo foi construído em cima da eliminação para o Tolima (COL). São inúmeros exemplos de vitórias históricas que, se bem estudadas, cavam sua origem em quedas duras, doloridas, cinzentas. E assim será neste derrotado 2020, em que todos nós perdemos muito do pouco que temos. Milhares a vida, outros a esperança, alguns o ânimo, milhões o emprego, a dignidade. O problema é que não sabemos quando a dor será transmutada em evolução, crescimento e conquista. O túnel está apenas no início.

"Então, relaxa". Era o mantra de um cara que jogava solto no mundo. Em 2017, um baixinho gorducho, de colete vermelho, camisa roqueira, calça de escoteiro e tênis último tipo da Nike chegava à Rua das Palmeiras, 315 para um programa semanal sobre música e futebol. Alegre, mas não efusivo, sagaz, sarcástico, tinha uma zoeira para cada um assim... de bolso. Era o Rodrigo. De tão talentoso ganhou mais um programa, de humor, com o Rudy Landucci, que virou meu irmão.

A empresa mudou de sede e ele foi atrás, com sua craviola. Chegava à redação com celular em punho fazendo stories de todos nós, com uma zoeira para cada um. Um dia era a minha falta de cabelo, em outro era uma frase de Raphael Prates, a forma física de Bruno Faria, o gol de Oscar Ulisses. Tudo era motivo para boas risadas, um trocadilho e uma palavra com duplo sentido. Os momentos antes do "Zona Mista" virou café no pátio e no Shopping, histórias da banda, de outros artistas, boleiros, resenha. Deveria ser sobrenome: RR = Rodrigo Resenha.

Há um ano não falávamos porque, de fato, não éramos grandes amigos. Mas Rodrigo brilhava no ar "como uma estrela que não está lá", como a canção de Fábio Júnior que ele lembrava vez ou outra. Achávamos que ele nunca iria embora; ainda mais assim, repentinamente. Mas RR era assim mesmo, chegava sorrateiro, ia embora como um ilusionista. Quando não estava legal, pedia o boné, pegava o violão e saia atrás da felicidade dele. Assim ele se foi. Este mundo estava muito baixo-astral para ele.

Uma derrota para nós, que gostávamos do seu talento, da sua picardia, da sua generosidade. Não sei ainda o que estas milhares de vidas perdidas vão nos ensinar, menos ainda se vamos aprender algo. O fato é que a passagem das páginas da folhinha vai acabar nos dizendo alguma coisa ao final deste escuro túnel que atravessamos. Se o esporte imita mesmo a vida, deve ser algo positivo após os 90 minutos desse jogo. Os livros dizem que a vida é este descontrole relativo, o qual temos a ilusão torpe de sermos protagonistas. Mas que dói a lição... ah, isso dói.

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