Se o gol é comparado ao orgasmo, essa nossa Copa do Mundo vai no sentido inverso: está murchinha da silva

Se o gol é comparado ao orgasmo, essa nossa Copa do Mundo vai no sentido inverso: está murchinha da silva

Peço sinceras desculpas aos meus raros leitores (principalmente às leitoras) pelo título desta crônica. Pois, não contente com a flagrante deselegância, ele flerta com o mais ralo machismo. Sorte que a poesia concede a devida licença para analogias sexuais em se tratando de futebol. Se o gol é comparado ao orgasmo, essa nossa Copa do Mundo vai no sentido inverso: está murchinha da silva. Pelo que tenho visto, o desânimo é generalisado. Tudo bem, admito, como todo o paulistano, ultimamente venho sendo acometido de uma dose extra de mau humor.


São Paulo já foi condenada a padecer como o túmulo do samba. E parece querer enterrar junto o Mundial. Verdade que, seguindo o meu exemplo, a cidade anda (ou, melhor, não anda) um pouco mais neurótica que o habitual. Vive-se no fio da navalha: greve de metrô, a iminência da falta de água e muitos outros etecéteras. Um farol que demora a abrir, um minuto a mais na fila do Posto de Saúde, a chuva em escassez ou em abundância transportam do limbo ao inferno o pobre contribuinte.


Não se trata de chauvinismo ou de espírito suíno – oxalá tudo funcione bem e os gringos se encantem com o país para além dos estereótipos de praxe. O diagnóstico (assim como a regra) é claro: os arquibaldos e geraldinos estão com o saco na lua. Ainda bem. Isso significa que o enfaro e o espírito crítico não se dissipam em troca do pão e do circo. E, convenhamos, o todo-dia já é estafante o suficiente sem as isenções fiscais concedidas para a FIFA. 


A Globo bem que tenta pilhar o país, mas, assumamos, a coisa tá chocha pra caramba. Claro: não vão faltar as indefectíveis matérias étnicas. As “comunidades” tirando do armário as fantasias típicas com a mesma espontaneidade de operador de telemarketing. Faz-se um esforço quixotesco para criar a velha corrente para frente: armar um cenário onde cada ator-brasileiro relegue a dureza do cotidiano em troca do amor altaneiro pelo Brasil. Ser figurante numa Copa do Mundo impõe uma espécie de obrigação de “se entrar no clima”, de abraçar um patriotismo fora do tempo, com o automatismo de um cometa que passa sempre pelo mesmo lugar. Os sorrisos requentados de sempre, como no carnaval - só muda o uniforme dos repórteres pasteurizados. Somos impelidos a uma alegria de arlequim. Neste ano, não encontro por aí a disposição para bancar esse faz de conta.


O meu chapa Santoro me contou que viu uns croatas passeando pelos Jardins. Outros relatos dão conta de mexicanos soltos pela Avenida Paulista e em recantos menos familiares de São Paulo. É a Copa do Mundo, amigo! Será? De manhã, fui conferir o termômetro da cidade, onde ela realmente pulsa. Na porta da padaria, um sorridente Neymar me recebeu uniformizado, como faz há duas semanas: pronto para entrar em campo, munido de um Chicabom. Foi o mais perto que eu cheguei da Seleção. A dupla de ataque pão na chapa e média de coador forra o ânimo para o dia. De umbigo no balcão, o Brasil x Croácia foi assunto ausente. Resolvi perseverar: sou brasileiro, não desisto nunca.


No caminho para o trabalho, as buzinas me soaram mais nervosa do que ontem. Graças a uma manifestação contra a morte da bezerra, fiquei pelo meio do caminho. O remédio foi antecipar o PF no Bar do Mário. Mesa na calçada, esquina de movimento, a carrocinha do Jão Sanhaço, estacionada em frente, coberta por bandeirolas do Brasil. Madureira, garçom de respeito, trouxe logo o trivial. Ensaiou um muxoxo quando perguntei sobre o time do Felipão. É... paciência.


Minha última esperança piscava na tela de 40 polegadas. De soslaio pude flagrar o breaking news que avisava eufórico: Jeniffer Lopez mudou de ideia e embarcou para o Brasil. Como diria o outro, haja coração...

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